Querem frear a internet

13-05-2010 13:07
Bruno Ferrari - Revista Época - Edição 621
 
Uma corte americana abriu uma brecha para os provedores reduzirem a velocidade de quem usa muito a rede. Por que isso é ruim para todos


SOM DAS RUAS
O compositor Moby (à esq.) em manifestação de 2006, pelo direito de baixar músicas na rede sem restrições das operadoras


Quem acompanha o YouTube desde seu início sabe quanto o serviço evoluiu em apenas cinco anos. Em 2005, ele era só um repositório de vídeos com baixa resolução. Hoje, inclui imagens de alta qualidade de filmes, séries e outros programas, que podem ser reproduzidas nos monitores de TV mais avançados. Essa evolução tem um custo – a banda de internet, ou capacidade de tráfego da rede. Quanto mais os serviços de conteúdo evoluem, mais banda é necessária para transmiti-los pelos cabos e servidores. A grande questão é: quem paga pela expansão da banda?

Na semana passada, uma corte de apelações dos Estados Unidos tomou uma decisão que poderá prejudicar não só os usuários do YouTube, mas de qualquer serviço de baixar arquivos pesados. Ao julgar uma briga da operadora de internet Comcast com a Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês), órgão que regula o setor, os três juízes da corte abriram um precedente perigoso. Eles resolveram que a FCC não tem o direito de obrigar a Comcast a tratar todos os usuários de sua rede de forma igual – um princípio conhecido como neutralidade da rede. A briga se acirrou em 2008, quando associações de consumidores reclamaram que a Comcast limitava a velocidade da internet para quem usava serviços de compartilhamento de arquivos, como os baseados em Torrent, para trocar músicas, jogos e filmes. A FCC agiu, abrindo um processo contra a provedora.

Para a Comcast – como para qualquer operadora – faz sentido querer tratar os usuários de formas distintas, porque uma minoria consome uma grande fatia da banda na internet. De acordo com a Cisco, empresa que desenvolve equipamentos de rede, o tráfego de dados na internet tem crescido a uma taxa média de 40% ao ano. Em 2013, só a transmissão de vídeo em tempo real representará 60% do tráfego total. Juntos, todos os serviços de vídeo usarão 91% do tráfego. Para sustentar esse fluxo, as operadoras precisarão investir em infraestrutura, mesmo que a maioria dos clientes use a internet para serviços mais leves, como troca de e-mails. Elas sentem como se estivessem subsidiando esses clientes intensivos.

Uma alternativa seria a operadora cobrar mais de quem baixa mais dados, como fazem algumas empresas de telefonia. Mas aí elas perderiam clientes. O jogo que muita gente suspeita que elas façam é vender pacotes iguais para todos e discretamente reduzir a velocidade de quem usa mais. Eram essas acusações que a FCC queria investigar, e a corte americana não deixou.

60% da capacidade da internet, em 2013, será consumida para ver vídeos
A repercussão na mídia e no Congresso americanos foi bastante negativa. Alguns aliados do presidente Barack Obama viram aí um problema para os planos federais de levar internet de altíssima velocidade a todos os americanos. Quem pode garantir que a velocidade não será limitada pelas operadoras? “Os internautas perderam seu único representante”, disse Ben Scott, diretor da ONG Free Press, no site da organização. Há outros riscos. A possibilidade de discriminar o tipo de conteúdo que circula na rede pode abrir precedente para a cobrança de pedágios. A Telefónica, na Espanha, avisou que poderá intimar o Google, empresa que mais fatura na internet com o fluxo de visitas, a partilhar parte dos custos de manutenção da rede. Se isso acontecer, sites inovadores terão dificuldade para competir com os gigantes estabelecidos. A internet poderia perder sua capacidade de renovação.
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